Ouvir um poema dito pelo seu autor, em chinês, sem tradução, é uma experiência inesquecível. Começa logo pelo anúncio do nome. Não dá para distinguir onde termina o poeta e começa o poema. O mesmo se pode dizer em relação a poetas palestinianos e israelitas que se juntam para ler coisas que uns e outros escreveram, cada um no seu idioma. Para além das sonoridades de cada língua, ásperas, ambas, sempre é agradável registar que ainda há quem se entenda naquela parte do mundo e que, o mais que se atiram, uns aos outros, são palavras. Mas, onde é que eu ia, depois disto, tudo deixa de ter piada quando, de repente, até entendemos o que diz um poeta cubano.
Mas afinal o que é que se passa com o Manel? Virou poeta? Não, tranquilizem-se todos. Apenas calhou ter de ir a um encontro de poetas. Ter mesmo de ir. Desculpem a sinceridade, O Manel até gosta de poesia mas a tal evento não teria pensado ir de livre vontade.
Como se tratava de cerimónia de abertura, o pequeno anfiteatro estava cheio. Tive de sentar-me nas escadas. E não fui o único. «Estou feito», pensei, quando me dei conta que as escadas também encheram e que se quisesse fazer uma retirada estratégica a coberto da escuridão teria que pisar para aí umas sete ou oito pessoas. Mas porque é que não fizeram isto no Alvalade XXI? A apreensão cresceu à medida que, com os poemas, se foi intensificando a tensão nas vértebras da zona lombar, pouco ou nada preparadas para tais posições.
De cada vez que acabava a leitura de um poema o público batia palmas e o apresentador levantava-se. Só que em vez de agradecer aos presentes e pedir para alguém acender as luzes, anunciava o próximo poeta. E eles eram mais que muitos!
Às tantas, depois de dar voltas e reviravoltas, as que a posição permitia, senti, precisamente na zona dorida, dois dedos, ou melhor, duas unhas, espetadas. Surpreendido, mas sobretudo aliviado, virei-me para trás e vi uma mulher que sorriu e me disse em espanhol: «sou acupuncturista, vejo que sofre como o poeta»…
Bem, meus caros, se é tal a dor que o poeta sente, tiro, a todos, o chapéu.