O telefone soou de forma diferente. O primeiro toque pareceu-me mais longo do que é normal. Ainda antes de atender senti um arrepio. Coincidência ou não, “adivinhei” quem era. E era suposto ser eu a ligar.
Durante vários minutos pouco mais fui capaz de fazer senão ouvir. E confirmar, de quando em quando, que ainda estava aqui, deste lado da linha. Do outro, ouvi choro, sufocos de dor, de revolta, de incredulidade, ouvi perguntas a que não soube responder, “porquê?”, “porquê logo hoje?”, como se pudesse haver explicações ou fizesse diferença morrer a 31 de Dezembro ou noutro dia qualquer.
Já aqui se escreveu sobre a dor alheia, sobre a forma como tentamos aliviar quem é parte de nós e sofre, sobre a impotência que constatamos ter quando não podemos fazer nada. E que é ainda maior quando não podemos aparecer, do outro lado do oceano, literalmente, para abraçar, para confortar a alma com o calor do corpo. A minha atirou-me para momentos que teria preferido não revisitar. Alguém disse que fiquei surdo. Fiquei mudo também. E o meu silêncio causou, agravou desencontros.
Lamento.
O verdadeiro desencontro foi não poder ter estado com quem realmente necessitou de mim.